Quando a alimentação é usada como fonte de engajamento

Se você vive no Brasil (e talvez até fora), deve ter ouvido falar do Morango do Amor. De uma hora para a outra, a sobremesa se tornou um dos maiores fenômenos dos últimos tempos e dominou primeiro a Internet e, depois, todos os meios de comunicação, lojas e as casas de muitas pessoas.

Um aspecto interessante desse fenômeno é evidenciar como a comida é fonte de engajamento nas redes sociais. O desejo por determinados alimentos pode ser estimulado, da mesma forma que outros bens de consumo, como roupas e eletrônicos. Por isso, o Morango do Amor parecia inescapável. Virou uma trend e logo foi fomentada pelo mercado. Todo mundo “tinha que” provar.

Mas, ao mesmo tempo em quem esse mercado diz “consuma”, ele vilaniza outros doces ou alimentos que vão de encontro às ideias da cultura da dieta. É o tipo de mensagem que causa confusão e sofrimento em muita gente, pois existe o desejo de comer, de ter, de participar e, ao mesmo tempo, o sentimento de culpa em torno do que, no geral, é entendido como algo que deve ser evitado “se você não quiser engordar”. E isso se dá por conta dos mecanismos cruéis da cultura da dieta que dizem que apenas determinados tipos de corpos e comportamentos devem ser validados.

Uma faceta ruim desse processo é o estímulo ao consumo desenfreado e, com isso, a sensação de que, se você não pode participar, está ficando para trás. Também há o aumento dos preços: nesse caso, por exemplo, aumenta o preço do morango e outros produtos e o próprio doce vai ficando cada vez mais caro e inacessível. Entre os aspectos positivos está a valorização de quem produz, a movimentação da economia, entre outros.

Nesse sentido, é interessante quando um fenômeno como o Morango do Amor acontece porque ele escancara essas contradições. É muito bom vermos as pessoas falando sobre comida, vê-las experimentando sabores, texturas, gostando ou não daquilo. A comida – e tudo que ela implica, como sempre gosto de pontuar – como motivo de reflexão e conversas. Que a gente continue podendo falar e desconstruir visões preconceituosas e punitivas.